
EXPEDIÇÃO AMAZÓNIA
Huaorani - The Ancient Inhabitants of the Amazon
Em 2019 viajei durante 1 mês e meio na América central cujo objectivo era chegar ao Equador e entrar na selva amazónica em busca da tribo Huaorani. Conseguimos! Durante vários dias vivemos com esta tribo de forma bastante intensa.
Para entrar na tribo foi necessário:
- Assistir a um vídeo e apresentação de slides onde mostravam as tribos que ali coabitam, os assassinatos com flechas, as guerras territoriais, as consequências e traumas provocados por mordidas de cobras e as espécies perigosas que ali vivem.
- Após assistir aos slides, assinar um documento de responsabilidade no posto militar onde assumia que, estava ciente e consciente de que a partir do momento em que assinasse o documento e entrasse na canoa pelo Rio Amazonas acima, tudo o que acontecesse seria da minha responsabilidade, e não iria ter ajuda do governo / força militar.
Vou ser sincera, que ponderei muito recuar neste ponto e cancelar tudo. Mas ia deitar para o lixo todo o dinheiro já investido. E assinei, peguei na mochila, calcei as galochas e entrei na canoa do Penthi e da Laboto.
Começou a minha jornada, e eu não sabia no que me estava a meter…
Saímos de Coca pelas 12h aproximadamente e chegámos ao posto militar pelas 14:30h. Pelas 17:40h estávamos a entrar na canoa. Durante as 4h que durou esta viagem conhecemos a Dayuma, uma mulher que esteve praticamente morta com a mordida de uma cascavél, fazia naquele dia 3 meses e a perna direita dela ainda era o dobro do tamanho da perna esquerda, as marcas da mordida na zona do calcanhar evidenciavam bastante a largura da boca da cobra e as cicatrizes a profundidade das suas mandibulas. Assustador e ao mesmo tempo uma loucura!
Lembro-me de estarmos a dar uma das milhentas curvas que o Rio Amazonas faz, e o Penti aponta para um banco de areia junto à margem e diz que ali foi morto um da sua tribo com uma flecha SHUAR. Explicou-nos que o Rio é uma zona imparcial mas que o elemento teve um problema na canoa e teve de atracar naquele banco de areia, que pertencia à tribo SHUAR, e por estar a invadir território alheio foi morto. Arrepiaram-se? Imaginem eu.
A noite cerrada completamente escura e apenas com o reflexo da lua nas águas calmas do Amazonas apaixonaram-me. Ouviam-se os animais por todo o lado, e no céu brilhava a mais intensa estrela, Sirius.
Eram 21:45h quando chegámos à comunidade do Gabá. Assim que saí da canoa enterrei as galochas até ao joelho na lama, era muito difícil caminhar ali, e realmente perigoso para eles que andavam descalços sempre.
Entrámos e estava uma fogueira acesa, a cabana dele era feita de canas, o telhado em V invertido era feito de palhinhas das árvores e apenas existia uma cama de rede pendurada, que era a cama dele. Mas ele não vivia sozinho, tinha um papagaio de estimação. Que lindo que era!
No dia seguinte saímos pelas 14:24h e chegámos finalmente à comunidade Huaorani de Bameno pelas 22:40h.
Durante estes dias fomos pescar e caçar com eles, visitámos pântanos em busca das anacondas, vimos os famosos golfinhos cor-de-rosa do Amazonas, Capivaras, Aranhas, imensas espécies de pássaros, borboletas, macacos, e uma fauna e flora espantosa.
Os banhos tomavam-se com a água da chuva armazenada em jarricãs com a ajuda de folhas de plantas enormes para canalizar a água.
Assistimos a um evento privado e único com vários chefes de tribos diferentes em que cada um deles levou a sua “Chicha” feita de forma artesanal, é feita por elementos de cada tribo, em que mascam as folhas de uma planta, colocam num reservatório e deixam ali a fermentar. Eu dizia que não, mas via na cara deles a desilusão e por isso bebi de todas.
Percorremos os rios Chiripono, Gonanaco chico, Tiguino, Conanaco, Kuraray.
A comida: ou eram os peixes “Guémé” que as mulheres da tribo pescavam com ovos de tartaruga desenterrados, atados a um anzol artesanal com fio também artesanal. Ou a carne de capivara feita ao lume da fogueira acesa com o famoso rolar de pedrinhas como faziam os primórdios da civilização. Ou, o atum em lata com bolachas e bolos secos que levei para a viagem.
A água era dos garrafões que tínhamos levado, até acabar… E aqui começou o meu quase derradeiro final.
Sem água potável, num clima tropical em que transpirar é obrigatório durante as 24h do dia não era possível. Então recorremos à técnica de ferver a água do rio Amazonas e bebíamos.
Ao 4º dia de expedição fiquei doente, muito doente. Não sei se foi alguma picada de mosquito, se foi das diferenças de clima durante as 11h de viagem de canoa em que levámos com chuva, sol, vento e calor em 11horas. Se foi da água fervida, mal fervida que bebi, ou se foi da partilha da Chicha por todos os elementos das tribos e por mim. As febres eram altas, transpirava ainda mais ao mesmo tempo que tinha calafrios. Só queria estar deitada, não queria comer nem beber nada.
Lembro-me de ver vários elementos da tribo à minha volta e me darem umas folhas para eu esmagar com as mãos e meter no nariz. Cada vez que fazia isso sentia-me melhor. Mas passado algum tempo voltava a piorar.
Só pensava “vou morrer aqui, e ninguém sabe onde estou”. Cheguei a dizer ao meu colega de viagem para não me darem Ayauaska por mais doente que estivesse. Queria assistir a este ritual, mas jamais queria ser eu a vivê-lo na primeira pessoa.
Levaram-me ao acampanhamento Kichua, uma comunidade já mais civilizada com posto militar. Entrei acompanhada por uma menina da tribo chamada Verónica e o militar observou-me e através do rádio por frequência contactou a base médica militar. Deram-lhe as indicações da medicação que eu tinha de tomar. Informei-o que era alérgica a penincilina. E ele foi ao armário e tirou 1 comprimido. Deu-me e mandou-me tomar aquilo com água e deitar-me. Saí do posto militar e fui em direção à família do Penti, e por curiosidade olhei para o comprimido que era parecido a um rebuçado em tons rosa (pelo menos acho eu, porque já estava em modo de delírios com a febre) Nisto, o militar veio a correr em minha direção a tentar evitar que eu tomasse o comprimido, por ser um derivado de penincilina. Então voltei ao posto médico, tomei outro comprimido e fiquei ali umas horas deitada em observação e a ser medicada com o militar a fazer reports do meu estado de saúde a alguém do outro lado do rádio.
Comecei a sentir-me melhor após umas horas, permanecemos nessa noite naquela comunidade e eu dormi o dia / noite toda numa tenda dentro de uma barraca de madeira que era a “escola” deles acompanhada da Verónica. Lá fora ouvia as músicas e a festa que ambas as tribos faziam em volta das fogueiras a partilhar as suas “Chichas”.
No dia seguinte, estava outra. Bastante melhor e Viva!
Um dia vou voltar, e reviver a viagem que fiz, e voltar a fazê-la da mesma forma!
A coleção de arte “Huaorani - The Ancient Inhabitants of the Amazon” será um agradecimento à Laboto, Penti, Verónica, Gabá, Marcelo e os restantes elementos da tribo que me deixaram de lágrimas nos olhos aquando da minha partida de lá. Serei sempre grata a tudo o que vivi com vocês. E um eterno memorial à Nenkihui Bay que lutou até à sua morte contra a exploração de petróleo na reserva Yasuní.











